Missão: do vazio pastoral a uma presença efetiva e afetiva de Deus na Igreja

A missão não é uma opção. Opção é o Sacramento do Batismo, que a família ou a própria pessoa escolhe em recebê-lo. O Sacramento do Batismo, traz em si, não um conteúdo embutido, mas uma essência que se chama vida missionária. Batizar-se em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, é confessar-se discípulo missionário de Jesus Cristo de modo incondicional.

No processo de seguimento a Jesus, existem dois verbos com uma força muito grande:

VINDE, no momento, que ele chama para fazer conviver com ele, fazendo uma experiência profunda da presença de seu Pai (Jo 1,39), e o;

IDE, quando passados os três anos de convivência e aprendizagem, inclusive, após toda a tragédia de sua morte, ele se despede dos seus, enviando-os ao mundo para que batizem e façam discípulos (Mt 28,19-20).

Nesta perspectiva, não existe seguidor de Jesus, que não seja missionário. Caso alguém insista em segui-Lo sem desejar ser missionário, viverá uma farsa, ou seja, será sempre um batizado que renega seu batismo.

A experiência missionária como consequência do Batismo faz com que o batizado tenha para com o mundo, o mesmo olhar de Jesus, e assim, “as alegrias e as esperanças, as dores e as ansiedades dos homens desta época, especialmente os pobres ou de alguma forma aflitos, essas são as alegrias e esperanças, as dores e ansiedades dos seguidores de Cristo. Na verdade, nada genuinamente humano deixa de criar eco em seus corações”.[1]

A missão nasce do vazio pastoral, deixado por Jesus, quando ressuscita e ascende ao Céu. A alegria da ressurreição, aos poucos vai esmorecendo, quando ele anuncia, que deverá subir para o Pai e deixá-los novamente, somente que desta vez, não ficariam mais sozinhos, porque na despedida, além do envio, há uma promessa, ele estará presente até o fim dos tempos(Mt 28,20). E é em nome desta promessa, confiantes em sua Palavra, que os onze discípulos se refazem da perda física e se enchem da presença do Espírito e partem em todas as direções do mundo, anunciando, que Jesus está vivo.

O túmulo vazio, que lhes havia causado uma tristeza ainda maior, que a morte, com a aparição do Ressuscitado se torna o ponto de partida para algo que nunca mais teria fim, a missão, o que aprenderam em três anos, se tornaria um jeito de ser e viver para sempre. Pentecostes, marca em definitivo a estreia dos discípulos, que são missionários. O medo desparece, as portas se abrem (Atos 1), e as sinagogas, e os templos  e os caminhos se tornam espaços de anúncio da Boa Nova.

Alguns afirmam, que a Igreja nasceu em Pentecostes, outros dizem, que nasceu do lado aberto de Cristo[2], sejam uns, sejam outros, ambos têm razão, pois a Igreja é um processo, iniciou, e segue adiante.

Uma coisa é certa, não tem como ser Igreja, se não se é missionário. A missão é da natureza da Igreja.[3] Não é de hoje, que a missão é a essência da fé. Desde os primórdios da humanidade, que a presença ativa de Deus, fez-se missão, porém, somente com o envio de Seu Filho, Jesus Cristo, e do Espírito Santo, que se pôde formalizar essa experiência chamada Igreja, gerada no seio as Santíssima Trindade, onde o Pai em sua vontade salvífica, envia seu Filho com a missão de fundar uma nova comunidade, que é santificada e vivificada pelo Espírito Santo.[4] E assim, se inaugura um novo tempo no Reino de Deus.

Por que trouxemos essa reflexão sob o título de Missão, do vazio Pastoral a uma presença efetiva e afetiva de Deus na Igreja?

Exatamente por entendermos, que a cristandade, abriu esse vazio em meio à experiência eclesial, que cada batizado deveria fazer. Não há Igreja, sem a vivência autêntica da fé, que se manifesta nas atitudes e nas ações daqueles que se dizem crentes. O vazio se dá exatamente aqui, onde muitos crentes, vivem a fé não segundo Cristo e sua Igreja, e sim segundo seus conceitos e preconceitos.

É preciso revisitar a origem da Igreja. Rever e reaprender com os primeiros cristãos, como se deve de verdade seguir Jesus. O vazio pastoral surge cada vez, que alguém que diz crer, se afasta da experiência fundante do seguimento, onde tudo era posto em comum e não havia necessitados entre eles (Atos 2, 42-46).

Nossa proposta de reflexão sugere, que essa Igreja, que é um corpo, cuja cabeça é Cristo(Cl 1,18; Ef 1,22), precisa urgente reencontrar um caminho efetivo e criativo para continuar sendo transmissora de fé e não há caminho mais eficiente e afetivo, que o processo de Iniciação à Vida Cristã[5].

A experiência missionária, não é algo que se vive sozinho. Deus não é solidão, mas comunidade, não uma comunidade qualquer, mas a perfeita e a melhor comunidade. É uma comunidade Trinitária, o Pai, o Filho e o Espírito Santo, onde a experiência mais profunda entre as três pessoas é a comunhão, que se manifesta no grande amor, que um tem pelo outro.[6] É na comunidade, que a missão acontece de verdade. E quanto mais afetivas, mais acontece o processo de evangelização, por isso, hoje o melhor lugar para anunciar e viver a boa nova é nas Comunidades Eclesiais Missionárias, lugar onde o vazio pastoral é superado pela capacidade de acolhimento do outro assim como ele é. Essas comunidades “são chamadas a serem espaço de encontro, da ternura e da solidariedade, são o lugar da família, com suas portas abertas”.[7]

A missão é a expressão da Paixão de Cristo pelo Reino e pela Humanidade. Não se faz missão em meio a seres celestiais, porque estes já conhecem a Deus em sua plenitude. Ser apaixonado por Deus, significa ser apaixonado pelas mulheres e homens, que peregrinam neste mundo. E na Igreja, ninguém, mais que as leigas e leigos conhecem tão bem o que é ser peregrino, é por causa disso, que eles e ela, leigas e leigos são os protagonista da missão.

A missão é sempre a mesma, seu conteúdo nunca muda, no entanto os contextos em que se inscreve, está em constante mudança, exigindo sempre mais capacidade e habilidade de adequação ao tempo, ao espaço e à linguagem. Vivemos hoje uma época, em o ambiente de evangelização, mesmo aquele nos lugares mais remotos, se vive uma cultura cada vez mais urbana, exigindo dos batizados que estejam sempre mais preparados para missionarem de um modo cada vez mais urbano e humanizado.

O urbano cobra de todos, posturas, atitudes e ações, que dialoguem com as realidades humanas: cultura, economia e religião cada vez mais sofisticadas e complexas. E aqui nasce a grande necessidade de uma pastoral sinodal, partindo sempre do lugar teológico do outro.

[1] CONCILIO VATICANO II – Gaudium et Spes, n. 1.

[2] Catequeses de São João Crisóstomo, bispo, Cat. 3,13-19, séc. IV).

[3] CONCILIO VATICANO II, Ad Gentes, n. 2.

[4] ___________________, Lumen Gentium n. 2-4.

[5] CNBB. E a Palavra habitou entre nós – Estudos 114. Brasília: Edições CNBB, 2021, n. 36.

[6] BOFF, Leonardo. A Santíssima Trindade é a melhor comunidade. Petrópolis: Vozes, 1988.

[7] BARUFFI, Dom Adelar. Comunidades Eclesiais Missionárias, 19/06/2019. https://www.cnbb.org.br/comunidades-eclesiais-missionarias/ acessada 02/09/2021.