SOMOS UMA IGREJA SOFRIDA, MAS QUE JAMAIS SERÁ VENCIDA!

Será que já não é hora de pararmos de enviar dinheiro para "padres ou pastores cantores ou encantadores", e apoiarmos e amarmos mais nossos padres, que, sem cantarem e nem fazerem falsos milagres anunciam com simplicidade e amor a Palavra de Deus, nos garantem a Eucaristia, visitam nossos doentes, abençoam nossos entes queridos e nos atendem em qualquer momento que precisarmos?

Dom Ettore Dotti – Bispo de Naviraí MS

Nossa Diocese se alegra grandemente pela ordenação sacerdotal de dois novos padres, mesmo diante das intempéries que vive a sociedade nos últimos meses e dos inúmeros desafios. Como Igreja particular de Naviraí, temos que agradecer sempre pelas muitas coisas boas que acontecem na nossa amada Diocese. Mas, de novo, nesses dias, a Igreja Católica é causa de manchete nas mídias (não que as outras Igrejas não sejam, mas quando se trata da Igreja Católica a mídia parece fazer festa), não pelo testemunho, mas por escândalo por suspeita de suposta irregularidade nas atividades e movimentações financeiras ligadas a Associação Filhos do Pai Eterno (Afipe); doações destinadas à construção da Basílica do Divino Pai Eterno de Trindade (GO).

Não quero nem de longe acusar, justificar ou defender a Associação Afipe ou o sacerdote envolvido: a justiça deve fazer o próprio dever, e, será ela a dar a última palavra, após minuciosa investigação e ampla defesa. Contudo, esta denúncia de irregularidades deve ser um alerta para todos nós, que administramos a Diocese, as Paróquia e Comunidades, para que, com toda transparência, não permitamos que surjam nenhuma suspeitas ou dúvidas a respeito entradas sejam em forma de ofertas, dízimos ou quaisquer outro tipo de doação em nossas igrejas. Temos a obrigação moral de administrar honestamente o que não é nosso. A Igreja é uma entidade inserida na sociedade civil e, como tal, é obrigada a cumprir todas as leis financeiras e econômicas previstas em lei.

Mas este “temporal mediático” me faz refletir e perguntar: “de onde veio tanto dinheiro? Alguma diocese, arquidiocese ou congregação  seriam tão ricas e generosas ao ponto de arrecadar valor tão alto?” Eu penso que não. Porém, vendo os tantos pedidos de doação que chegam de todos os lugares, à nossa Cúria Diocesana, imaginando os muitos outros que enchem as caixinhas de correio das casas, e ainda ouvindo várias pessoas de nossas paróquias que me dizem que colaboram com tal padre ou obra de tal lugar, particularmente fico preocupado.

Estou bem convencido de que precisamos ser generosos, mas me pergunto e vos pergunto: será que não é hora de pararmos de enviar dinheiro para “padres ou pastores cantores ou encantadores”, e apoiarmos e amarmos mais nossos padres, que, sem cantarem e nem fazerem falsos milagres anunciam com simplicidade e amor a Palavra de Deus, nos garantem a Eucaristia, visitam nossos doentes, abençoam nossos entes queridos e nos atendem em qualquer momento que precisarmos?

Reflitamos!

Com isto quero dizer com toda firmeza que devemos ser generosos sim, e nos sentirmos comunidade, ajudarmos as Igrejas que sofrem, aquelas que têm menos recursos do que nós, sobretudo, nos empenhando através das campanhas de solidariedade propostas ao longo do ano, e entregando nosso dízimo e nossas ofertas nas nossas secretarias paroquiais ou entregando-as aos nossos padres. Assim estaremos mais tranquilos, sendo mais solidários com nossa Igreja particular, e confiante que nossa comunidade socorrerá aqueles que verdadeiramente estão precisando. As dioceses têm uma corrente de solidariedade garantida por contadores a administradores qualificados e o controle da CNBB. Nossa Diocese já socorreu outras em momentos de calamidade e desespero. Por outros canais a Igreja não responde.

Pe. Renato Nascimento Ordenado 22/08/2020

Mas mesmo com crises, erros e escândalos a Igreja nunca será vencida, mesmo que deverá passar por um novo e doloroso processo. O exemplo dos bons, que são uma multidão não pode ser suprimido pelos maus exemplos de uma minoria. Refiro-me às palavras proféticas do Papa Bento XVI, quando ainda cardeal, já imaginava: “uma Igreja redimensionada, com menos seguidores, obrigada a abandonar também boa parte dos lugares de culto construídos nos séculos. Uma Igreja católica de minoria, pouco influente nas escolhas políticas, socialmente irrelevante, humilhada e obrigada a ‘recomeçar das origens'”. A “profecia” encerrou uma série de programas no rádio que o então professor de teologia, Joseph Ratzinger, realizou em 1969, num momento decisivo de sua vida e da vida da Igreja. Eram os anos violentos da contestação estudantil, da chegada do homem à Lua, mas também das batalhas sobre o Concílio Vaticano II que acabava de se concluir. “Poderia acontecer para a Igreja atual, ameaçada pela tentação de reduzir os padres em ‘assistentes sociais’ e sua obra em mera presença política. Da crise atual surgirá uma Igreja que terá perdido muito. Ficará pequena e terá que recomeçar mais ou menos das origens. Mas também uma Igreja que, não pleiteará um mandato político, namorando ora a Esquerda e ora a Direita. Através desta ‘enorme reviravolta’, reencontrará a si mesma e renascerá ‘simplificada e mais espiritual'”.

Queridos, tudo isto parece já ter começado. A pandemia já nos ensinou a rever nossa ideia de ser Igreja: uma Igreja que sabe dar o justo valor aos sacramentos, à Palavra do Evangelho e à partilha. A previsão é uma redução numérica, sim, e já está acontecendo há muitos anos, mas perderemos os que nunca foram verdadeiramente católicos, enquanto os católicos autênticos serão luz e fermento de uma Igreja nunca vencida, porque fundada por Cristo e por desejo de Deus.

Sempre unidos nas orações.

 Dom Ettore Dotti – CSF

Bispo de Naviraí MS